julho 23, 2007
julho 18, 2007
OS FANTASMAS
Álvaro Pacheco
Abro a gaveta
onde se esconderam uns fantasmas
e eu guardei outros, disfarçados de palavras,
camisas limpas que não pude vestir
e papel em branco, envoltos
em ninhos de sombras
e pedaços de luz
da lamparina de azeite
do oratório de minha mãe -
abro a gaveta
vagarosamente, assustado
para que não me assustem
como quando era menino
e os temia
mas conversava com eles
na escuridão do quarto.
Tenho medo da gaveta
e desses seus conteúdos
que poderão trazer de volta os fantasmas,
os que guardei e os que se esconderam
apenas esperando o tempo
de se apresentarem à minha solidão
e desesperança
para cobrar a vida que não tivemos
eu e os meus predecessores, eu
e os meus perseguidores, eu
e os que não me amaram, eu
e os que não pude amar -
esses fantasmas todos
perdidos e escondidos
nestas gavetas de ventos e de fantasias
entreabertas pelos vácuos de minha vida
e depositárias, como fantasmas,
dos anseios do tempo inteiro,
e do que restou de minha inocência
dos anos de luz, esses curtos anos
de mitos e fantasias
realizados no cristal da infância.
FRIO
Licínia Quitério
Como são frias as tardes
por trás dos vidros frios das janelas.
São tardes longas que nem a noite esperam.
São apenas tardes frias e longas
sem lagartixas nos muros
pretensamente austeros de pedra solta.
Tardes hirtas e esquálidas
como os santos de El Greco
porém a preto e branco
que sépia é ousadia.
Como são velhas estas tardes.
Atravessaram o cristal da estepe
desgrenhadas pelo vento
amarrotadas pelo rolar do tempo.
Chegaram e marcaram lugar
do lado de lá do vidro frio das janelas.
Pobre de quem contempla
o banco frio onde se alonga a tarde.
Quando a tristeza acontece, sabe bem porquê. Podemos ouvi-la a pedir que a acarinhem. Em versos, em prosas, em músicas, em danças.
Se a ignoram, transforma-se em raiva. Se a mascaram, pode chamar-se horror. Um dia, irá embora. Nunca de vez. Como nós, que sempre partimos e voltamos. Ou desejamos que assim seja...
L.Q.
Mafra - Portugal
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