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NA MINHA TERRAÁlvares de AzevedoLaisse-toi donc aimer! Oh! l'amour c'est la vie.C'est tout ce qu'on regrette et tout ce qu'on envie,Quand on voit sa jeunesse au couchant décliner. . . . . . . . . La beauté c'est le front, l'amour c'est la couronne,Laisse-toi couronner!V. HUGO IAmo o vento da noite sussurranteA tremer nos pinheirosE a cantiga do pobre caminhanteNo rancho dos tropeiros;E os monótonos sons de uma violaNo tardio verão,E a estrada que além se desenrolaNo véu da escuridão;A restinga d'areia onde rebentaO oceano a bramir,Onde a lua na praia macilentaVem pálida luzir;E a névoa e flores e o doce ar cheirosoDo amanhecer na serra,E o céu azul e o manto nebulosoDo céu de minha terra;E o longo vale de florinhas cheioE a névoa que desceu,Como véu de donzela em branco seio,As estrelas do céu.IINão é mais bela, não, a argêntea praiaQue beija o mar do sul,Onde eterno perfume a flor desmaiaE o céu é sempre azul; Onde os serros fantásticos roxeiamNas tardes de verãoE os suspiros nos lábios incendeiamE pulsa o coração! Sonho da vida que doirou e azulaA fada dos amores,Onde a mangueira ao vento tremulaSacode as brancas flores,E é saudoso viver nessa dormênciaDo lânguido sentir,Nos enganos suaves da existênciaSentindo-se dormir;(...)IIIQuando o gênio da noite vaporosaPela encosta braviaNa laranjeira em flor toda orvalhosaDe aroma se inebria,No luar junto à sombra recendenteDe um arvoredo em flor,Que saudades e amor que influi na menteDa montanha o frescor!E quando à noite no luar saudosoMinha pálida amanteErgue seus olhos úmidos de gozo,E o lábio palpitante...Manuel Antônio Álvares de Azevedo.
São Paulo - SP, 1831 - 1852.
Obras Principais: Obras I (Lira dos Vinte Anos), 1853;
Obras II (Pedro Ivo, Macário, A Noite na Taverna, etc), 1855
OCEANO NOXAntero de QuentalJunto do mar, que erguia gravementeA trágica voz rouca, enquanto o ventoPassava como o vôo do pensamentoQue busca e hesita, inquieto e intermitente,Junto do mar sentei-me tristemente,Olhando o céu pesado e nevoento,E interroguei, cismando, esse lamentoQue saía das coisas, vagamente...Que inquieto desejo vos tortura,Seres elementares, força obscura?Em volta de que idéia gravitais?Mas na imensa extensão, onde se escondeO Inconsciente imortal, só me respondeUm bramido, um queixume, e nada mais...Antero Tarqüínio de Quental.
Ponta Delgada (Açores), 1842 - 1891
A CAMINHO DA CASARenata PallottiniTalvez haja uma carta, ou um livro, ou um poema.Quando menos há a necessidade de sentir-me doméstica.Eis o que significa todos termos um endereço:não é para que os outros nos achem,mas para que nós nos achemos.Recuperada a tranquilidade do silêncio que nada turba,porque os ruídos familiares nem mais ruído são(tic-tac de relógio que um crocodilo manso engoliu).Recuperada a unidade de lugar e a unidade de posses:meus livros, meus discos, meus. . .Ontem nada me pertencia, na rua,sob o influxo da noite profunda.Mas é que agora estou a caminho da casa.Dessa coisa que faz dos marinheiros seres humanos.©Renata Pallottini
Chão de Palavras
Editora Círculo do Livro, São Paulo, 1977
A CONCHAOssip MandelshtamTalvez te seja inútil minha vida,Noite; fora do golfo universal,Como concha sem peróla, perdida,Me arremessaste no teu areal.Moves as ondas, como indiferente,E cantas sem cessar tua melodia.Mas hás de amar um dia, finalmente,A mentira da concha sem valia.Jazer só a seu lado pela areiaE pouco faltar para que a escondasNessa casula onde ela se encandeiaà sonora campânula das ondas,E as paredes da frágil concha, poucoa pouco, se encherão do eco da espuma,Tal como a casa de um coração oco,Cheio de vento, de chuva e de bruma...(1911)
Tradução: ?
Poeta Russo, nascido em 15.01.1891
Terminou seus dias num campo de prisioneiros, em 27.12.1938, na Sibéria.
Estudou na Escola de Tenishevsky, Universidade de Heidelberg e Universidade de St. Petersburg.
SAUDADEPablo NerudaSAUDADE... - Que será... eu não sei... tenho buscadoem certos dicionários poeirentos e antigose outros livros que ocultam o significadodessa doce palavra de perfis ambíguos.Dizem que as montanhas são azuis como ela,que nela empalidecem longínquos amores,e um nobre e bom amigo meu (e das estrelas)nomeia com os cílios e as mãos em tremores.E no Eça de Queiroz sem olhar a adivinho,o segredo se evade em sua doçura e sede,como essa mariposa, corpo em desalinho,sempre longe - tão longe! - de minhas calmas redes.Saudade... tens, vizinho, o real significadodessa palavra branca que, peixe, se evade?Não... treme na boca seu tremor delicado...Saudade...
©Pablo Neruda - (Fundación Pablo Neruda), 1974
Título Original: Crepusculario
Tradução: José Eduardo Degrazia
L&PM, Ed. 2004
A PRIMAVERA
Egito GonçalvesPouco sabemos sobre a Primavera!Mas sabemos que as árvores reverdecem,navios dançam sobre vagas curtase às janelas abrem-se os sorrisosque adoçam os olhares e as manhãs.Sabemos que o amor vem dos telhadospara ceifar os restos da agoniae no ar límpido que anuncia o Verãoa coragem ganha alento, novos ritmos.Sabemos que são fáceis as viagense o lançar de escadas sobre o abismo;que os ventos são amenos e é possívelcom um sopro afastar o silêncio e angústia.Sabemos que um relógio quebra a inérciae ordena que se queimem os arquivos;que há pássaros e peixes que perfurama rede com que o cerco nos limita.Sabemos que então se lavra terraonde germina o pão e os lilasese é doce repousar sobre os teus seios- primaveras também, esperança, vida...
© Egito Gonçalves
De: Poemas Políticos 1952-1979
Moraes editores, 1980
OS AMIGOSSophia de Mello Breyner AndresenVoltar ali ondeA verde rebentação da vagaA espuma o nevoeiro o horizonte a praiaGuardam intacta e impetuosaJuventude antiga -Mas como sem os amigosSem a partilha o abraço a comunhãoRespirar o cheiro a alga da maresiaE colher a estrela do mar em minha mão1993
©Sophia de Mello Breyner Andresen
(de: Musa, 1994)
SOBRE TI MESMO...
©Carol Timm Tu te sentas no teu banco do jardim,Enquanto contempla os passarinhos,E pensas nos quintais da tua infância... Tu escolhes a hora do dia que o sol brando,Deixa as aves mais a vontade para voar...E bate as asas com elas em pensamento ou sonho. Tu entendes que a vida é essa passagem.Essa aventura até mesmo do que ficou para trás.Das tardes noutros países, noutras paisagens... Tu já compreendes que não há morte para ti.Todos os fantasmas te habitam e com eles revives,As histórias de tua avó e as tuas histórias são continuidade...
©Carol Timm
Esse maravilhoso poema recebi da Carol,
em resposta ao poema O JARDIM, de autoria da Renata Pallottini.
Obrigado, de todo coração, Carol.
A Foto foi uma das minhas primeiras fotos aos 12 ou 13 anos
de idade, com minha velha Rolleiflex, revelada e copiada em casa.
Fotografia, essa mágica paixão.
III - QUANDO OS MEUS OLHOS...Mario QuintanaQuando os meus olhos de manhã se abriram, Fecham-se de novo, deslumbrados: Uns peixes, em reflexos doirados, Voavam na luz: dentro da luz sumiram-se Rua em rua, acenderam-se os telhados.Num claro riso as tabuletas riram.E até no canto onde os deixei guardadosOs meus sapatos velhos refloriram.Quase que eu saio voando céu em fora!Evitemos, Senhor, esse prodígio... As famílias, que haviam de dizer?Nenhum milagre é permitido agora...E lá se iria o resto de prestígioQue no meu bairro eu inda possa ter!...©Mario Quintana / Helena Quintana 1994
Em: A Rua dos Cataventos, pág. 21
2. Edição - São Paulo - Editora Globo, 2005
ROMANCE INGÉNUO DE DUAS
LINHAS PARALELASJosé FanhaDuas linhas paralelasMuito paralelamenteIam passando entre estrelasFazendo o que estava escrito:Caminhando eternamente de infinito a infinitoSeguiam-se passo a passoExactas e sempre a parPois só num ponto do espaçoQue ninguém sabe onde éSe podiam encontrarFalar e tomar café.Mas farta de andar sozinhaUma delas certo diaVoltou-se para a outra linhaSorriu-lhe e disse-lhe assim:"Deixa lá a geometriaE anda aqui para o pé de mim...!Diz a outra: "Nem pensar!Mas que falta de respeito!Se quisermos lá chegarTemos de ir devagarinhoAndando sempre a direitoCada qual no seu caminho!"Não se dando por achadaFica na sua a primeiraE sorrindo amalandradaPela calada, sem um gritoDeita a mãozinha matreiraPuxa para si o infinito.E com ele ali à frenteAs duas a murmurarOlharam-se docementeE sem fazerem perguntasPuseram-se a namorarSeguiram as duas juntas.Assim nestas poucas linhasFica uma estória banalCom linhas e entrelinhasE uma moral convergente:O infinito afinalFica aqui ao pé da gente. ©José Fanha
Em: Eu Sou Português Aqui
O JARDIMRenata PallottiniNeste velho jardim há três cachorrosenterrados; seus ossos e seu pêlo.Sua morna gordura transitóriahoje é húmus e flor para o jardim.Também sangue enterrado de memória;também gritos e fugas infantis.Trepadeiras encobrem lagartixas,há um louco derramar-se do capim.Crescerem plantas é o silêncio. Tudoé o mesmo silêncio, de manhã.As orquídeas azuis já feneceramhá muito tempo em cinza neste chão.Os animais passam furtivos, entreos restos de cerâmica e folhagem.O muro abre nas fendas novos rumose em torno o eterno musgo manso nasce.Os três cachorros jazem enterrados,numa constância fiel que não tem fim.Sua morna gordura é hoje o húmuse seus olhos são flor neste jardim.
©Renata Pallottini
Chão de Palavras
Editora Círculo do Livro, São Paulo, 1977
QUEM PODE IMPEDIR A PRIMAVERA
Ruy CinattiQuem pode impedir a PrimaveraSe as árvores se vão cobrir de floresE o homem se sentiu sorrir à Vida?Quem pode impedir a surda guerraQue vai nos campos deslocando as pedras- Mudas comparsas no ritmo das estações -E da terra inerte ergueu milhares de lançasQue a tremer avançam, cintilantes, para o limiteEm que a luz aquosa se derramaComo um mar infinito onde o aradoAbre caminho misterioso à seiva inquieta!Quem pode impedir a PrimaveraSe estamos em Maio e uma ternuraNos faz abrir a porta aos viandantesE o amor se abriga em cada um dos nossos gestos.Quem?...Se os sonhos maus do Inverno dão lugar à Primavera!De: Nós não somos deste mundo, 1941
PORTUGAL
SE EM PÁSSAROS . . .Renata PallottiniSe em pássaros a tarde vaise a água do lago é verdepor que não somos nós pacíficos mortaisse a morte é essa renovada perdase pelo lago a voz das crianças voae se as crianças ao seu redor (da voz)tentam voar, por que não somos nósalguma coisa assim tranquilamente boae como as árvores e como o campo (florese jamais afã) não vamos nósao encontro da tarde e de sua vozde seus silêncios e de suas corese amor não damos, se em pássaros se vaiesta tarde, talvez a última e a mais purae não sorrimos e não choramos enquanto a tarde durae não nos debruçamos sobre a água que caiverde como os verões, verde de folha verdeclaríssima e translúcida, guardadaentre os limites pétreos da amuradae as brancas lindes destas alamedas.Ah, ser respiração de árvore, ondeadavaga de ramos, rendas de folhagensou qualquer coisa de animal e de selvagemainda assim naturalmente branda...Se em tremores se vai a tarde ao ventoe outra igual sabe Deus quando virápor que não agradeço a qualquer deus em pensamentoantes que a tarde ao vento para sempre se vá?
©Renata Pallottini
Chão de Palavras
Editora Círculo do Livro, São Paulo, 1977