O JARDIM
Renata Pallottini
Neste velho jardim há três cachorros
enterrados; seus ossos e seu pêlo.
Sua morna gordura transitória
hoje é húmus e flor para o jardim.
Também sangue enterrado de memória;
também gritos e fugas infantis.
Trepadeiras encobrem lagartixas,
há um louco derramar-se do capim.
Crescerem plantas é o silêncio. Tudo
é o mesmo silêncio, de manhã.
As orquídeas azuis já feneceram
há muito tempo em cinza neste chão.
Os animais passam furtivos, entre
os restos de cerâmica e folhagem.
O muro abre nas fendas novos rumos
e em torno o eterno musgo manso nasce.
Os três cachorros jazem enterrados,
numa constância fiel que não tem fim.
Sua morna gordura é hoje o húmus
e seus olhos são flor neste jardim.
©Renata Pallottini
Chão de Palavras
Editora Círculo do Livro, São Paulo, 1977