outubro 01, 2007



SE EM PÁSSAROS . . .

Renata Pallottini

Se em pássaros a tarde vai
se a água do lago é verde
por que não somos nós pacíficos mortais
se a morte é essa renovada perda

se pelo lago a voz das crianças voa
e se as crianças ao seu redor (da voz)
tentam voar, por que não somos nós
alguma coisa assim tranquilamente boa

e como as árvores e como o campo (flores
e jamais afã) não vamos nós
ao encontro da tarde e de sua voz
de seus silêncios e de suas cores

e amor não damos, se em pássaros se vai
esta tarde, talvez a última e a mais pura
e não sorrimos e não choramos enquanto a tarde dura
e não nos debruçamos sobre a água que cai

verde como os verões, verde de folha verde
claríssima e translúcida, guardada
entre os limites pétreos da amurada
e as brancas lindes destas alamedas.

Ah, ser respiração de árvore, ondeada
vaga de ramos, rendas de folhagens
ou qualquer coisa de animal e de selvagem
ainda assim naturalmente branda...

Se em tremores se vai a tarde ao vento
e outra igual sabe Deus quando virá
por que não agradeço a qualquer deus em pensamento
antes que a tarde ao vento para sempre se vá?


©Renata Pallottini
Chão de Palavras
Editora Círculo do Livro, São Paulo, 1977